domingo, 18 de abril de 2010

Violência Contra a Mulher: um grito a favor da Igualdade

Violência Contra a Mulher: um grito a favor da Igualdade

Tanto se discute em nossos dias sobre a violência e suas principais formas de atuação, contudo, poucos debates informais têm focado o seu real significado. A palavra violência vem do latim violentia, que, segundo o dicionário Aulete Digital da Língua Portuguesa significa emprego ilegítimo e abusivo de força e coação em que se objetiva conseguir algo. Outra definição de violência provém do dicionário digital Michaelis da Língua Portuguesa em que a violência é considerada como todo ato de opressão, tirania e irascibilidade, em que o constrangimento físico ou moral pode agir sobre uma pessoa obrigando-a em submeter-se a vontade de outrem.

Embora tais conceitos tenham sua relevância, é necessário, no entanto, compreendermos que a violência é também um fenômeno social e que pode variar de acordo com o contexto histórico cultural vivenciado. É interessante destacar que nas Sagradas Escrituras existem histórias de mulheres que sofreram condenação, preconceito e violência. É possível verificar no relato de João 8:3 -11 que fariseus trazem a Jesus uma mulher que, segundo estes, "havia sido pega em adultério". A rudimentar violência observada no discurso condenativo destes homens é a demonstração explícita de crenças e valores arraigados no desvalor de uma sociedade machista. O desejo pelo apedrejamento foi nada mais que a exposição tácita do quão insignificante e excluída se encontrava a mulher neste momento histórico e cultural. Neste contexto, sabiamente Jesus sugere que cada homem olhe para si mesmo, e, ao voltar os olhos para o próprio "eu" os mais velhos, ao compreenderem a mensagem, iniciam sua retirada, seguidos pelos mais moços. Esta é uma descrição que confirma que Jesus não condenou a mulher, ao contrário, perdoou seus pecados e a aconselhou a seguir uma vida correta, uma verdadeira demonstração de tratamento igualitário de gênero.

Um segundo relato pode ser encontrado em João 4:1 – 42 em que a mulher samaritana se dirige a Cristo com as seguintes palavras:  "_Como sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?"  Este fragmento de diálogo demonstra o espanto sentido pela mulher e expõe indiretamente o  que esta aprendera em seu longo processo de socialização –comportar-se de acordo com as normas de uma sociedade segregadora em que o preconceito, a estigmatização e os estereótipos acumulados ao longo dos séculos não eram questionados nem tão poucos "quebrados". É justamente neste meio social em que a mulher fora concebida como ser inferior  e  que samaritanos não se relacionavam com judeus, que Jesus transmite seu amor incondicional por ela, rompe barreiras de preconceitos e, como conseqüência, a mulher reage positivamente, resultando  na propagação da mensagem, pois, é possível verificar no versículo 39 de João 4: "Muitos dos samaritanos daquela cidade creram nele, por causa do testemunho da mulher: " _ Disse-me tudo o que tenho feito." Este exemplo ilustra exatamente como Jesus nunca aceitou conceitos culturais de inferiorização da mulher, pois esta, de acordo com o posicionamento de Cristo,  pode ser colocada  no mesmo lugar social que o homem.

É válido compreender que em diferentes tempos históricos e contextos sócio-culturais cada sociedade pode demonstrar percepções diversificadas sobre a violência contra a mulher. Na sociedade brasileira, segundo a pesquisa "percepção e reações da sociedade sobre a violência contra a mulher" realizada em 2006 pelo IBOPE, de cada quatro entrevistados, pelo menos três acreditam que a justiça trata o assunto da violência contra mulheres com pouca importância e que as penas utilizadas são irrelevantes, o que pode contribuir para manter a impunidade. Além disso, pelo menos 60% dos entrevistados pensam que, quando a mulher denuncia a violência em nosso país, nada acontece com o agressor. A pesquisa também informou que 51% dos pesquisados alegam conhecer pelo menos uma mulher que é ou foi agredida pelo companheiro.

Neste sentido, é possível destacar que no Brasil um fato ocorrido em 1983 deu início a uma das principais lutas contra violência feminina. Foi  o acontecimento vivenciado por  Maria da Penha Maia Fernandes, que, enquanto dormia, levou tiros do marido, o que resultou em paraplegia adquirida por toda sua vida. O caso ficou pendente durante vários anos na Justiça do Ceará o que contribuiu para aumentar ainda mais o sofrimento da brasileira que pedia para que o fato não fosse esquecido. Santos (1999) comenta que foi somente em 1997, que a questão começou a ganhar notoriedade, pois chegou ao conhecimento da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) onde iniciaram investigações sobre o atendimento a mulheres vítimas de violência no Brasil e, também, sobre o caso específico de Maria da Penha. Desse modo, em 2001 a OEA exigiu da Justiça Brasileira um desfecho rápido do ocorrido, o que favoreceu para que, em 2002, fosse preso Heredia Viveros – ex-marido de Maria da Penha Maia Fernandes. A prisão, no entanto, foi cumprida parcialmente, pois Heredia completou, em regime fechado somente um terço da pena de dez anos de prisão.

Mesmo com a morosidade do processo, o caso desta brasileira contribuiu para o desenvolvimento da conhecida lei Maria da Penha – lei número 11.340 que, segundo Brasil (2006), foi sancionada em 07 de agosto de 2006, e visa, entre outros mecanismos, tratar com maior rigor e punições casos de violência doméstica contra mulher. Comenta Aquino (2009) que desde a implantação desta lei foram presos mais de 1,8 mil homens e os benefícios foram sentidos por cerca de 20 mil mulheres.

É interessante notar, no entanto, que, em pesquisa do DataSenado de 2007, apenas 8% das brasileiras se consideram respeitadas no país sendo que o restante 92% pensam que a mulher não é respeitada no Brasil. Estes dados demonstram que, infelizmente, o descaso com relação à violência contra as mulheres ainda permanece vivo em nossa sociedade. Isto pode ser verificado pela recente notícia divulgada pela revista ISTOÉ (dez.2009) que mostrou que a lei Maria da Penha pode ser extinta pelo Senado Federal.  Segundo a matéria, existe um projeto de lei em tramitação no Senado, que, se aprovado, poderá alterar o Código de Processo Penal, e conseqüentemente, os crimes de violência doméstica contra a mulher poderão ser considerados de menor potencial, podendo ser reparáveis com indenizações e pagamentos de cestas básicas. É importante ressaltar que esse tipo de posicionamento tende a enfraquecer leis que como esta, são reconhecidas mundialmente o que corresponde a mais uma demonstração das tentativas de anulação de conquistas pelos direitos realizadas por mulheres ao longo de vários anos neste país.

Historicamente, o processo nacional que busca a igualdade de gênero, ganhou espaço principalmente pela atuação dos movimentos feministas que, segundo o portal "O progresso das mulheres no Brasil"  avanços ocorreram principalmente pelas mudanças na legislação, criação das delegacias especializadas, serviços de atendimentos as vítimas, além da crescente produção de estudos sobre violência contra a mulher e desenvolvimento de políticas públicas específicas. Corroborando esta idéia, para Barsted (1999) foi no final da década de 70 que sistematicamente foi organizado o movimento de mulheres brasileiras no enfrentamento da violência, em que as feministas passaram a ter participação ativa para invalidar a famosa tese da "legítima defesa da honra". A autora comenta que o movimento foi se consolidando de tal maneira que no início da década de 90 o Superior Tribunal da Justiça rejeitou de forma explícita tal idéia. (Seria possível  relacionar tal sanção com as atuais tentativas de extinção de Lei como a Maria da Penha _ Lei 11.340!).

Segundo Barsted (1999), no início dos anos 80, as delegacias de Mulheres passaram a ser criadas e encontraram maior receptividade em cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Tais delegacias faziam parte das propostas das feministas que compreendiam a importância do atendimento integral as mulheres em situação de violência. Quanto às denúncias feitas para o "Ligue 180" (Central de atendimento a mulher),  segundo o site de Forum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos, de 2007 para 2008 houve um aumento 32% do número de denúncias. É por isso que, há urgente necessidade de cada mulher fazer sua parte!! Seja em uma delegacia de polícia ou em uma delegacia de mulher, denuncie! Não contribua para que a impunidade continue calando o grito de mulheres que buscam  por uma vida digna e igualitária.

Joseane Cordazzo de Lemos

Psicóloga  – CRP 01/14474

REFERÊNCIAS

Aquino, Wilson. IstoÉ: Conquista ameaçada. Federação Nacional dos Policiais Federais. Disponível em: http://fenapef.org.br/fenapef/noticia/index/25481

Barsted, Leila Linhares. A violência contra as mulheres no Brasil e a Convenção de Belém do Pará dez anos depois (1999) . Disponível em: http://www.mulheresnobrasil.org.br/interno.asp?canal=violencia&id=violencia. Acesso em dezembro de 2009.

Brasil (2006) – Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm Acesso em dezembro de 2009

DORON, Roland; PAROT, Françoise (Org.) Dicionário de psicologia. São Paulo: Ática, 2006. 863 p

DICIONÁRIO Digital Michaelis Língua Portuguesa Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Acesso em dezembro de 2009.

DICIONÁRIO Digital Aulete da Língua Portuguesa Disponível em: <http://www.auletedigital.com.br/download.html>. Acesso em: dezembro de 2009

Forum de entidades nacionais de direitos humanos. Disponível em: http://www.direitos.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=4838&Itemid=1. Acesso em fevereiro de 2010.

Galinkin, A.L. (2007). Novas e velhas violências contra a mulher. Apresentado no 2º

Congresso Internacional sobre a Mulher, Gênero e Relações de Trabalho. Realização da

Procuradoria Regional do Trabalho de Goiânia, Goiânia, 2007.

Pesquisa DataSenado sobre Violência Doméstica Contra a Mulher (2007) Disponível em: http://copodeleite.rits.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/noticias.shtml?x=671

Acesso em dezembro de 2009

Percepção e reações da sociedade sobre a violência contra a mulher – Pesquisa Ibope/Instituto Patrícia Galvão 2006.  Disponível em: http://copodeleite.rits.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/noticias.shtml?x=527

Acesso em dezembro de 2009

Santos, Angela. Violência doméstica um caso exemplar. O progresso das mulheres no Brasil. Disponível em: http://www.mulheresnobrasil.org.br/interno.asp?canal=violencia&id=violencia . Acesso em dezembro de 2009

FONTE: http://www.novotempo.org.br/advir/?p=2717&utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed%3A+Advir+%28Advir%29